Quantas vezes não conseguimos expressar em palavras o que estamos sentindo?
Somos habitantes de um estranho mundo que exalta a individualidade, mas que, comicamente, gera poucas experiências verdadeiramente individuais. Podemos creditar isso às redes sociais, onde tudo é compartilhado e nada parece ser original. Graças a elas, descobrimos que estes sentimentos que não sabíamos expressar em palavras e acreditávamos se tratar de uma experiência completamente individual, são, em outras culturas, descritos por uma única palavra.
Este fenômeno linguístico é conhecido como vocabulário focal, consistindo basicamente no léxico de um grupo social desenvolvido de acordo com sua cultura, ambiente etc. Sabe-se da existência de povos de regiões polares com dezenas de palavras referentes a diferentes tipos de neve e tons de branco. Casos mais famosos também, são da palavra “Saudade" e da palavra Cafuné, ambas existentes somente no nosso idioma.
Até hoje, não pude ler nenhum texto que demonstre de maneira tão profunda este fenômeno linguístico como este trecho de “O livro dos Abraços” de Eduardo Galeano:
“Diego não conhecia o mar. O pai, Santiago Kovadloff, levou-o para que descobrisse o mar. Viajaram para o Sul. Ele, o mar, estava do outro lado das dunas altas, esperando. Quando o menino e o pai enfim alcançaram aquelas alturas de areia, depois de muito caminhar, o mar estava na frente de seus olhos. E foi tanta a imensidão do mar, e tanto seu fulgor, que o menino ficou mudo de beleza. E quando finalmente conseguiu falar, tremendo, gaguejando, pediu ao pai:- Pai, me ensina a olhar!”
Neste contexto, trago à luz a palavra alemã waldeinsamkeit, que apesar da estranheza gerada a nós brasileiros por sua escrita e fonética, exprime o belíssimo sentimento de estar sozinho em meio à natureza, se sentindo acolhido por ela. Acredito que todos nós já sentimos isso e não soubemos nos expressar.
Apesar da individualidade deste sentimento, devemos notar o que há de partilhado nessa experiência de acolhimento e, principalmente, nas mudanças de comportamento coletivas que se fazem necessárias para que, desta vez, a natureza se sinta acolhida por nós.
Imagem - Criador: Biletskiy_Evgeniy | Crédito: Getty Images
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